Há livros assim: o autor e a editora são selos suficientes para que o possamos trazer sem abrir. E uma história para cada letra era obviamente certeira para o miúdo que lê sofregamente as tabuletas da rua e os papéis que os irmãos deixam na mesa logo de manhã.
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Foi na mala para a quinta; fizemos as contas a quantas histórias teríamos de ler por noite para o conseguirmos acabar até ao final do ano e combinámos ler 4 histórias por noite, duas eu, duas ele. E assim foi.
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Já não vale muito a pena voltar a falar aqui de Oliver Jeffers; é o nosso herói, pronto. Esteve aqui desde o início deste blogue — O incrível rapaz que comia livros continua a estar no top 5. A ideia deste mestre pegar na empreitada do clássico abecedário ou dicionário (em que tantos outros mestres mais cedo ou mais tarde pegaram: Bruno Munari, Maurice Sendak, Quentin Blake, Edward Gorey) foi o suficiente para nos atirarmos a este livro cheios de expetativa.
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As micro-histórias não são todas obras-primas, claro, mas a construção do livro — histórias independentes mas que criam uma espécie de microcosmos onde relações, private jokes e desenlaces viajam de umas para as outras — é desde logo garantia de que vamos ver diferentes episódios duma mesma série, e isso cria uma enorme cumplicidade entre o leitor e o livro e, neste caso, também entre a dupla de leitores!
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Exemplo disso são as letras A e Z, cujo protagonista é o Astronauta Edmundo: o problema enunciado na página do A do seu medo das alturas arranja um princípio de solução na página do Z. Pelo meio, há histórias magníficas — minimais, desconcertantes ou politicamente incorretas — como a da letra Q de Questão oculta, ou a da T de A terrível tragédia do datilógrafo, ou da letra H de Habitação de Alto Risco, umas das minhas favoritas.
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O R adorou a empreitada (e eu também): ler um livro enorme logo na abertura do ano, de A a Z, com palavras difíceis, deu-lhe um incrível sentido de poder.
Há uns dias, em casa da Avó, disse que queria ler sozinho, e ia-se afastando para o lado para que a Avó nem pudesse espreitar e ajudá-lo.
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Esta coisa da leitura partilhada é uma nova fase engraçada. Umas vezes ponho-o a ler os diálogos e eu a ler a narração, outras vezes lemos página sim, página não. É uma forma divertida e suave de lhe passar a pasta. E como é incrível assistir, de dia para dia, à transformação da voz suave e hesitante numa mais forte e segura, cheia de chhs do 1º dente que lhe caiu!
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Quem sabe, um dia, quando eu for uma velhinha desdentada e já não conseguir ver bem, possa ser ele a ler para mim.
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Orfeu mini, 2016
Oliver Jeffers
isbn 9789898327758
Posso acrescentar o alfabeto da Sonia Delaunay à lista? É um daqueles livros que está na nossa lista de desejos há seculos, mas ainda não compramos... (e acabo de descobrir que também existe em português: http://www.fnac.pt/Alfabeto-Sonia-Delaunay/a916435)
ResponderEliminarFiquei curiosa, relativamente ao Jeffers, de como ficou a tradução pois imagino que deve ter sido feita alguma ginástica para fazer coincidir texto e ilustrações em português? Ou nem por isso?
Pode e deve! Vou espreitar, sou grande fã desta grande senhora.
ResponderEliminarEm relação à tradução não tenho o original para comparar e imagino que tenha sido uma empreitada difícil. Acho que há histórias acutilantes e outras mais mornas, mas não sei dizer se são assim no original ou se tem a ver com a tradução. Mas com o cuidado tão atento em todos os do livro, aposto que está muito bem!
Obrigada pelas suas visitas.
Obrigada pela resposta - de facto sem ter o original é difícil saber; fui espreitar as opiniões na Amazon americana e há vários a se queixarem ser um livro não adequado a crianças por falar de fogos, morte, vingança etc. e utilizar palavras difíceis como "enigma" ou "molécula". Enfim.
ResponderEliminarAcabo de comprar o catálogo da exposição da Sonia Delaunay em Paris (2014/5) na Fnac, que está nos preços mínimos... gosto especialmente dos tecidos e bordados dela, são deslumbrantes!
Paola, a resposta ficou todo este tempo aqui pendurada... Era assim:
EliminarNão confiaria muito na opinião pública americana, muito menos agora... A mim isso não me chamou a atenção, e sim que havia histórias/ilustrações mais conseguidas e outras menos. O cuidado com o politicamente correto é uma preocupação muito americana. Tanto quanto sei através de autores que editam nos Eua e na Europa, o que se pode e não pode lá fazer em termos de livros infantis quando comparado com as editoras europeias é, para nós, bastante ridículo. É claro que há temas e temas, idades e idades, contextos e contextos; mas uma palavra nova e difícil nunca fez mal a ninguém e nada melhor que um livro para tratar de alguns temas quentes, digo eu!