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11.4.24

A beleza da finitude

Há livros assim, muito específicos, que chegam, sem aviso, em momentos também eles inesperados.
Este livro-pergunta chegou numa semana cheia de interrogações, fragilidade, desamparo, saudade, memórias e encontros.

Para sempre é muito tempo, mas é exatamente essa capacidade de imaginar um infinito abstrato, que carregamos na nossa genética, que nos pode trazer alguma consolação perante o inexplicável mistério da vida.

Num livro muito forte, que tem sido o meu livro do metro, lia, há uns dias, sobre como o capitalismo é um dos fatores que impulsiona o descarte dos mais velhos.
Do sem sentido das recorrentes buscas do elixir da juventude ou da eternidade. E de como o que dá sentido à vida e ao modo como a vivemos e nos relacionamos uns com os outros é precisamente o facto de morrermos. 

Mas a beleza da finitude é diretamente proporcional à dor que provoca.

Neste livro, a finitude está em cada recanto do quotidiano banal, no desenho preciso e belo de objetos de todos os dias, de espaços de conforto que são muitas vezes o desenho de um pavimento, um conjunto de ingredientes num cesto, uma chávena preferida ou uma mesa coberta de fotografias. E na ausência de gente. 

Onde está quem se foi? É a pergunta. Neste álbum, a resposta está muito nas ilustrações. Porque quem vai fica connosco nos lugares que habitou, nas coisas que tocou.
Mas principalmente nos caminhos que nos abriu, na presença que nos deu, na sabedoria que partilhou e nas memórias que nos deixou.
Ficar é uma grande responsabilidade: a de pegar no testemunho e de continuar a corrida — por nós, pelos que nos mostraram o caminho e pelos que vêm depois de nós.
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Quando é que a Hadda volta?
Orfeu negro, 2024
Anne Herbauts 
isbn 9789899071865

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